10 de mar. de 2011

O vento

Atrás das linhas inimigas
Escondido em baixo de alguns corpos fétidos
Encharcado de sangue seco
Quanto tempo algum recipiente de ar suportaria?
Quantas vidas já passaram diante daquele confuso e assustado olhar?
Um céu cinza sobra lá em cima
Uma sutil garoa lava de forma lenta a alma de vítimas e agressores
Homens sem sorrisos próprios
A meia luz por séculos de existência
Quase nem se recordam o odor de suas próprias carnes
Sequer se dão conta da cor de suas essências
A caçar e caçar os desavisados que se perdem diante de cada pós guerra
Lá esta o corpo inerte a se esquivar de suas limitações
Quase acreditando que é parte do cenário mórbido
Seus conceitos de fé foram atirados junto aos livros naquela grande fogueira em praça publica
Guiado por um sentimento tão intenso quanto uma vela acesa a dias
Ele tenta se virar alguns milímetros
É necessário algum sentido para acreditar em um corpo paralisado há tantas realidades
Dosando cada metro cúbico de ar que entre em teu já adaptado pulmão
Sabe ele que não pode perder nenhum ângulo que possa favorecer o teatro da sobrevivência
Então como se quase inconsciente
Com metade de seu peso já em seu particular mundo
Aquele quase acima de sua cabeça
Poe a se lembrar de uma distante e prospera época
Onde viver era o simples fascinante desafio diário
O sentir mais verdadeiro de cada manha o acordava de noites quentes
Com ventos que lhe fazia sentir acariciado levemente no rosto por mãos lisas
Seus anseios eram tão pouco canalizados
Seus espaços no estomago eram tão mais direcionados
E cada frio na espinha lhe faziam fechar os olhos a imaginar que poderia tocar o quase céu
Os olhares mais distantes que algum mortal poderia dispersar
Levado de teu reduto até a mais profunda odisséia interior
Jamais foi apontado em teu pequeno e breve mundo invisível e particular
Caminhando entre os que jamais puderam tocar o intenso planar sem perder o foco
Sim, de vez em hora era chamado pela insanidade momentânea ou permanente
A voz mais doce e amarga que poderia ouvir de dentro
Um jogo excitante e diário a ser decidido em um tabuleiro de prata
Jamais foi algum desafio estar ali em meio há pequenas batalhas de carne contra carne
Seu existir sempre se sobre pôs a todos estes breves devaneios
Trazido de volta para o trágico real
Ele pode notar cada ponto solto neste novelo de lã
Cada degrau manchado de sangue
Então percebe que o mundo a sua volta se torna sua mais perigosa arma
Ou sua mais intensa maldição
Estaria de fato ele onde seu corpo acredita estar?
Ou a lamina o fez parte de toda a dor?
O altar vazio, de fato esteve ali em seu plano físico como sempre acreditara?
Certezas e incertezas já não são mais tão relevantes neste ato
O ato mais esperado por todos aqueles que desejaram estar na platéia.
Um leve amargo na boca o faz questionar todo este tempo de fome
Uma fome que sequer era notada devido a teu estado catatônico
Um desejar que de tão intenso tornou se alvo daqueles que controlam cada mecanismo neste mundo de reais ilusões.
Um teste para os que estudam e avaliam a forma mais primitiva e humana de existir e sentir.
Jamais houveram tantas lembranças em teus devaneios
Jamais esteve diante de tantas nuvens abaixo do céu azul
Tudo se torna mais e mais confuso a cada passo
Imagens distorcidas se confundem com lembranças turvas.
Caminhando como aquele que foi presenteado com granadas a lhe acariciar teus ouvidos e sentidos
Um ruído apenas lhe guia de encontro ao nada
Desnorteado e seminu, carregando o quase nada que lhe resta de fé
A mesma velha garoa de todos os dias e noites
Caem como pequenos pedaços de céu
Como se chorasse prevendo a perda de teu mais lucrativo e interessante programa de domingo
O homem sem direção e sem memórias reais
Se Poe de joelhos sem motivo algum
E por mais que tentasse
Sabe que não consegue derramar a lagrima necessária para tornar o momento épico
Então com todo o teu ódio lhe queimando do peito até o começo da garganta
Ele suprime cada amor já sentido em sua frágil memória
Então de olhos apertados despeja tudo o que jamais foi teu por direito
Todos os desejos que jamais foram parte de si
Um grito que de tão potente arranha as paredes de vidros que abraçam o céu deste mundo confuso e bizarro
Logo uma fenda se abre acima de sua cabeça
Ele nota que todo o cinza que há
E todo o azul a qual se lembrara
Jamais foi tão azul como aquele que seus olhos incrédulos poderiam contemplar
Ele entende então
Sem instrução ou manuais
Ele enfim sabe o que é
De onde veio
Mas não de fato para onde deve ir
E deveria?
De punhos serrados o homem de roupas belas e claras como as manhas de seus devaneios
Abre as suas imensas asas e como uma fênix adormecida a tantas existências
Se Poe a voar como se rasgando o céu deste maldito e frio mundo
Nada mais restará ali
Apenas cinzas daquele que quase morreu
Acreditando que deveria morrer
E se libertou de si mesmo
Acreditando que deveria se libertar
E acreditou que poderia voar
Quando deixou de desejar o chão frio e sujo,
Aceitou a sua mais triste queda,
Seu inferno cinza de sangue
E só assim pode se redimir de si mesmo
Para enfim voltar a merecer seu verdadeiro dom...
O dom de merecer seu particular céu
Intenso e assustador azul
A cada bater de asas
O vento saberá o que dizer,
O tempo vai dizer onde chegar...

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